SÃO PAULO - Uma das principais
revelações do estudo arqueológico nas figuras históricas foi o fato de que d.
Amélia de Leuchetenberg, segunda mulher de d. Pedro I, foi mumificada - um dado
até aqui desconhecido de sua biografia. A imperatriz, que morreu em Lisboa em
1876 e cujos restos mortais foram trazidos à cripta do Ipiranga em 1982,
conserva pele e órgãos internos intactos. Cabelos, cílios, unhas, globos
oculares e órgãos como o útero estão preservados.
"É uma das múmias em melhor estado de
conservação já encontradas no País. Agora, precisamos pesquisar para entender
exatamente por que ela ficou assim e, mais importante ainda, compreender melhor
quem foi essa mulher, uma imperatriz esquecida na História do Brasil", diz a
arqueóloga Valdirene Ambiel, responsável pelas pesquisas na cripta do Ipiranga.
"Quando a trouxeram à cripta, em 1982, dizia-se que ela estava 'preservada', mas
ninguém sabia que poderia ser considerada múmia."
As causas exatas da
mumificação de d. Amélia ainda estão sendo investigadas - não era comum entre a
nobreza de Portugal que mulheres recebessem tratamento para ficarem preservadas.
"Pode ter sido um 'acidente de percurso'. Ela foi tratada para ficar conservada
alguns dias, para o funeral, e isso acabou inibindo o processo de decomposição",
diz Valdirene. Os exames no Hospital das Clínicas revelaram uma incisão na
jugular da imperatriz. Por ali, foram injetados aromáticos como cânfora e mirra.
"No caso de d. Amélia, havia um forte odor de cânfora quando abrimos o caixão.
Certamente, ajudou a anular o processo de decomposição."
Também contribuiu para a mumificação, segundo a
pesquisadora, a ausência de fatores para a decomposição. "A urna foi tão
hermeticamente lacrada que não havia microorganismos para realizar a
decomposição. É irônico que tenha acontecido justamente com Amélia, que pediu
expressamente um funeral simples, nos quais não se costumava preparar os mortos
para preservação", explica Valdirene, referindo-se ao testamento de Amélia de
Leuchtemberg, no qual consta o pedido de um funeral sem ostentações. O
documento, porém, só foi lido após o enterro, quando a mumificação já havia sido
preparada.
Após passar pelo aparelho de tomografia do
Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas e de receber uma biópsia, a
imperatriz foi "remumificada" - ela recebeu novo processo de embalsamamento,
semelhante ao qual havia passado 136 anos antes. Valdirene também foi a
responsável por preparar e aplicar na múmia uma solução semelhante à usada em
Portugal no século 18 (500g de naftalina, 500g de cânfora, 300g de manganato de
potássio, 2,5 litros de álcool a 92%, 2 litros de formol e 500g de timol). Com
gaze e algodão, passou a mistura em todas as partes visíveis da imperatriz -
face, pés, mãos e pescoço. "Também passamos a solução nas laterais do corpo
preservado, para que receba o tratamento por absorção. Nas costas ficou do jeito
que estava, já que não podíamos levantá-la do caixão", conta a arqueóloga.
Com a descoberta, o caixão de d. Amélia recebeu
um visor de vidro, que permitirá - apenas a pesquisadores - observar seu estado
de conservação. No plano que apresentou à Prefeitura, Valdirene se propõe a
fazer visitas semanais à cripta, para checar a preservação da múmia. "Faz parte
do projeto de preservação dos restos mortais da família imperial. Precisamos
tomar conta das descobertas", diz.
FONTES : ESTADÃO
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